DEUS PLURAL

DEUS PLURAL

INTRODUÇÃO

O estudo do Hebraico bíblico por vários séculos foi um privilégio apenas dos judeus para o estudo da Torah. A igreja cristã passou de largo do estudo da língua mater do Antigo Testamento; sobretudo com a mudança da igreja de Roma para Constantinopla e o uso do Latim como língua oficial da igreja romana. Os Pais da Igreja, quando interpretavam o Antigo Testamento se valiam da Septuaginta, ou outras edições comuns no período (pelas famílias textuais), como, por exemplo, a versão Copta, muito usada pela igreja grega. Talvez o maior avanço em mais de dez séculos tenha sido a Vulgata Latina, obra perpetrada por Jerônimo. Posteriormente alguns reformadores produziram  traduções do Latim para as línguas comuns. Notório foi o esforço de Lutero pela tradução para o alemão do texto sagrado onde se valeu de textos nas línguas originais tanto do Antigo como do Novo Testamento. Depois de Lutero, o próximo avanço significativo acontece no século XIX com as Sociedades Bíblicas ao redor do mundo. O Hebraico Bíblico passa a ser explorado e bastante divulgado entre os estudiosos do Texto Sagrado.

O Hebraico Bíblico tem suas particularidades. É uma língua prática e concreta; diferentemente do grego que é uma língua subjetiva e abstrata. O vocabulário bíblico do Antigo Testamento gira em torno de mais ou menos 300 verbetes. Se fizermos uma comparação grossa, a língua portuguesa hoje dispõe de mais ou menos 65 mil verbetes. Temos, no Hebraico Bíblico, uma quantidade reduzida de palavras para expressar o Sagrado. Mas isso não foi problema, pois a língua foi muito bem utilizada pelos homens santos que falaram da parte de Deus (II Pedro 1:21).

Quando Ário, bispo de Alexandria, no III século questionou a divindade do Filho e do Espírito Santo, se valeu do pensamento filosófico da substância indivisa de Deus, ou seja, o Ser de Deus não pode ser dividido. Para fundamentar seu argumento utilizou-se das edições do Antigo Testamento em Grego. E, por sinal, todas as principais e grandes questões dentro do cristianismo estão, quase sempre nos textos do Novo Testamento, por conta da notória ambiguidade da língua.

ANALISANDO TEXTOS- GREGO

Já na Septuaginta lemos o texto de Gênesis 1:1 assim:


"ἐν ἀρχῇ ἐποίησεν ὁ θεὸς τὸν οὐρανὸν καὶ τὴν γῆν".


Analisemos:


ἐν = é uma preposição, aliás, a preposição mais comum na língua grega. E, como na língua portuguesa, as preposições sempre aparecem acompanhadas, e desprovidas de independência linguística. Estão sempre juntas a substantivos, adjetivos, verbos e advérbios para "marcar as relações gramaticais que elas desempenham no discurso" (Moderna Gramática Portuguesa de Evanildo Bechara). As preposições podem indicar direção, tempo, causa. Nesse caso em especifico a partícula prepositiva "ἐν" sugere direção, e é traduzida comummente nesse texto com o equivalente a "em", no sentido de direção.

ἀρχῇ = é um substantivo feminino na forma Dativa. E significa, primordialmente, início, origem, princípio, começo. Quando os substantivos vêm declinados na forma Dativa sempre vão indicar destino/origem, por isso a preposição "ἐν" aparece antes. E a equivalência em língua portuguesa seria: em+a origem= na origem; em+ o início= no início; em+ o princípio= no princípio; em+ o começo= no começo.

ἐποίησεν = é a forma verbal de ποιητής, poeta, no passado simples e na terceira pessoa do singular. E ποιητής, na versão ἐποίησεν pode significar poetizar: "No Princípio Poetizou...".

ὁ θεὸς = substantivo masculino singular  Nominativo. Traduzido por "Deus": substantivo masculino singular. O caso Nominativo é o caso do sujeito. Ele aparece para indicar quem é o sujeito da ação.

τὸν οὐρανὸν = é o substantivo masculino "céu" ou "céus". As vezes também traduzido como "firmamento".

τὴν γῆν" = é o substantivo feminino "terra".

Bom, depois de analisado solidamente os termos da oração, junta-se tudo e faz-se as devidas equivalências para a língua a ser traduzida. Essa é a forma grega de Gênesis 1:1. Isto é, esta é a tradução de Gênesis 1:1 do Hebraico para o Grego.


ANALISANDO TEXTOS- HEBRAICO

Vejamos o texto em Hebraico:

BERESHID BARAH ELOHIM ET HASHAMAIM VEET HARETZ

A equivalência do texto para o grego é quase que idêntica. Vejamos:


BERESHID equivale a ARXÉ: princípio, começo, início, origem.

BARAH equivale a POIETÉS. Aqui, em BARAH, já temos uma grande diferença. Enquanto o poeta (POIETÉS) parte de uma materia pré-existente para criar sua poesia, no verbo BARAH temos apenas Deus como o autor da ação. Nunca o verbo BARAH é usado tendo o homem como centro da ação. BARAH é criar a partir do nada (ex nihilo). Deus cria o vento em Amós 4:13 com o verbo BARAH, ou seja, do nada; Deus cria os novos céus e a nova terra em Isaías 65:17 com o verbo BARAH, do nada; e cria um coração puro em Salmo 51:10 também do nada com BARAH. E finalizamos a análise com ELOHIM.

No grego THEOS é o título genérico para as deidades do mundo antigo, sobretudo dos gregos. Os judeus e os cristãos se apropriaram do título para descrever a divindade judaico-cristã. Mas ELOHIM tem uma particularidade: no texto de Gênesis 1:1 está na forma plural. ELOHIM é a forma plural de ELOHAH, que, por sinal, gramaticalmente, estaria mais correto em ser aplicado ao texto, mas não o foi. O autor preferiu a forma plural mesmo usando o verbo no singular. O argumento do Plural de Majestade é comummente usado para justificar essa passagem. A falha do argumento está em que nenhum rei descrito na Bíblia trata a si mesmo na forma plural. O plural de majestade sempre acontece de uma terceira pessoa e sempre acompanha o verbo no plural. Em salmo 82:6 diz: "Vós sois deuses" (RA). Temos o "vós", segunda pessoa do plural e o verbo "ser" acompanhando o pronome e, junto a esses, "deuses", no plural. Mas no caso de ELOHIM em Gênesis 1:1 o verbo encontra-se no singular.

PROVA EXEGÉTICA

Isso explica algumas passagens:

1. Gênesis 1:26 onde Deus (ELOHIM) diz: "Façamos o homem a nossa imagem, conforme a nossa semelhança". Esse é Deus falando de Si mesmo na primeira  pessoa do plural.

2. Gênesis 3:22 Deus (ELOHIM) diz do homem: "Eis se tornou como um de nós". Mais uma vez Deus se trata no plural. Note que o numeral "um" está no singular, e isso caracteriza um plural de unidade: Deus está falando com Alguém igual a Si mesmo. Isso foi o prometido pela serpente em Gênesis 3:5 onde ela diz: "... Como Deus [ELOHIM], sereis...".

3. Gênesis 11:7 Deus (ELOHIM) diz: "Vinde, desçamos e confundamos...". Mais uma vez Deus trata a Si mesmo na primeira pessoa do plural. O verbo "vir" no Vocativo indica um chamado, uma interpelação. Não denota ordem. Deus está convidando Alguém de mesma natureza.

4. Isaías 6:8 ADONAI, Senhor, aparece no singular. E quando ADONAI fala diz: "...quem há de ir por nós?". ADONAI,singular, se trata por "nós", plural.  No mínimo ADONAI deveria vir ADONAHIM, a forma plural de ADONAI.

CONCLUSÃO

Deus é plural. E é plural porque é mais de um. Deus é uma unidade composta assim como um par de sapato vem com dois sapatos. Isso não fere em nada o SHEMAH ISRAEL onde diz que JEOVÁ é o ÚNICO Deus (Deut. 6:4). Deus é ÚNICO, único de uma unidade composta. E isso perpassa por toda a Sagrada Escritura. De fato não há a palavra TRINDADE na Biblia, mesmo porque foi Tertuliamo que a criou mas isso não quer dizer que ela não exista. Por toda as Sagradas Letras vemos as pegadas Tríplices de um  Deus Plural, de um Deus Trino, Triuno. Negar isso é contradizer o Texto Santo.

Francimar Pires

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