LÍNGUAS ESTRANHAS - Parte 1
LÍNGUAS ESTRANHAS - Parte 1
INTRODUÇÃO
A Doutrina das Línguas Estranhas hoje é ensinada nos púlpitos de pelo menos 75% da cristandade. Esse movimento surgiu no limiar do século 20 entre as igrejas dos bairros pobres americanos de super concentração negra. Os primeiros registros entre os protestantes dão conta do Movimento da Rua Azuza, Los Angeles, no Estado da Califórnia, liderado por William Joseph Seymour, pregador afro-americano de confissão Batista.
O movimento à priori foi criticado pela imprensa secular e por teólogos adversos. Considerado movimento que feria a Ortodoxia Clássica Histórica Americana, foi questionado por todas as linhas de pensamento de seu tempo.
Hoje o movimento é considerado, pelos historiadores, como o principal catalizador do pentecostalismo.
No Brasil o movimento se estendeu graças a dois missionários suecos, Gunnar Vingren e Daniel Berg, que chegaram a Belém, no Estado do Pará, em Novembro de 1910, vindos direto dos Estados Unidos. Passaram a frequentar a igreja Batista local. E pouco tempo depois, seus hábitos e costumes trouxeram um certo alvoroço à igreja. Logo a pequena congregação dividiu-se entre os que eram contra e os que eram à favor das novas práticas e ensinos. Separados, o movimento ganha força quando em 1930 a maior igreja pentecostal do país inicia suas atividades de forma independente.
Hoje, entre pentecostais e neo-pentecostais, tem-se um movimento abrangente em cerca de 80% dos evangélicos.
Depois da fundamentação histórica, uma pesquisa nas Escrituras faz-se necessário para avaliarmos detidamente a harmonia entre a Doutrina das Línguas Estranhas e a Bíblia. O que o Livro Sagrado tem a dizer? Falar em Línguas Estranhas é bíblico? Tem base bíblica tal ensinamento?
DESENVOLVIMENTO
Dividiremos nosso estudo em cinco partes, onde verificaremos detalhadamente os textos usados para defender o uso do referido ensino. Primeiro analisaremos os termos e usos da palavra Glossa e Dialectos e suas variantes dentro do texto grego; e Lashon e Saphah no texto Hebraico. Segundo, estudaremos Isaías 28:11 e 33:19; Marcos 16:17-18; e I Coríntios 13:1. Terceiro, averiguaremos quatro textos: Atos 2, Atos 10, Atos 19 e I Coríntios 14. Quarto, investigaremos as quatro listas dos Dons: Romanos 12:6-8; Efésios 4:11; I Coríntios 12:8-10 e verso 28. Quinto, verificaremos algumas das aparições dos Anjos na Bíblia. E, por fim, avaliaremos nas considerações finais.
OS TERMOS NO HEBRAICO E GREGO
No Antigo Testamento temos o termo LASHON, traduzido como "língua, idioma, fala". Sua frequência no Texto Antigo é de 115 vezes, principalmente nos livros poéticos e em menor frequência nos livros proféticos. O primeiro uso do termo na TORAH encontra-sem em Gênesis 10:5 onde diz: "Estes repartiram entre si as ilhas das nações nas suas terras, cada qual segundo a sua língua...". Nesse texto, o termo LASHON é traduzido como língua no sentido de idioma, aliás, todas as vezes que LASHON aparece, sempre traz a ideia de língua e idioma.
Outro termo usado com frequência é SAPHAH, sempre se referindo a língua estrangeira, idioma de outra nação.
O termo correspondente no Grego é GLOSSA e seu sinônimo é DIALECTOS.
GLOSSA é um substantivo feminino e pode significar língua, como órgão da fala e do paladar; pode significar língua, idioma. E DIALECTOS é um substantivo neutro que tem o sentido de idioma.
ISAÍAS 28:11 e 33:19
"Pelo que por lábios gaguejantes e por língua estranha falará o SENHOR a este povo" (ARA).
"Não verás mais aquele povo cruel, povo de fala tão profunda, que não se pode perceber, e de lingua tão estranha que não se pode entender" (ARC).
A expressão língua estranha de Isaías 28:11 refere-se claramente à língua estrangeira. É o termos SAPHAH.
Deus tinha falado ao Seu povo na língua deles por meio de Seus mensageiros, os profetas, mas eles não ouviram. Então Deus prometeu falar por outros meios, primeiramente os Assírios e, mais tarde, os babilônios, os persas e os romanos. Paulo aplica essa passagem para referir aos que queriam falar em um idioma para não serem entendidos (I Coríntios 14:21). O mesmo acontece em Isaías 33:19.
MARCOS 16:17-18
"E estes sinais acompanharão aos que crerem: em meu nome expulsarão demônios; falarão novas línguas; pegarão em serpentes; e se beberem alguma coisa mortífera, não lhes fará dano algum; e porão as mãos sobre os enfermos, e estes serão curados".
Os que defendem as Línguas Estranhas argumentam que em alguns manuscritos não há o Adjetivo nova, antes do substantivo língua. A polêmica de fato não gira nem em torno do adjetivo mas de todo o final de Marcos, desde o verso 9 até o 20, por não constar nos melhores manuscritos (por exemplo: códice Vaticano e Sinaítico). Porém, edições bem antigas e confiáveis (a edição Copta, por exemplo e a edição Alexandrina) dão conta de um final mais longo para o Segundo Evangelho e junto vem o adjetivo nova antes do substantivo língua. Isso quer dizer que sempre foi: "Em meu nome [...] falarão novas línguas...", ou seja, novos idiomas.
I CORÍNTIOS 13:1
"Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o címbalo que retine".
Aqui está a famosa expressão Paulina e de uso frequente nos meios pentecostais: "língua dos anjos".
Primeiramente Paulo usa uma condicionante: ainda que. Essa condicionante é a conjunção " Ἐὰν" que dá uma condição e não uma realidade. Ou seja, "se eu falasse a língua dos homens e dos anjos". Não quer dizer que os dois idiomas existam. Pelo menos um dos dois sabemos que existe: a língua dos homens. Já a língua dos anjos carece de investigação.
A LÍNGUA DOS ANJOS
Todas as vezes que um Anjo do Senhor aparece na Bíblia e fala com alguém, sempre fala no idioma dos que vão ouvir. Nunca os ouvintes aprendem um idioma angelical para entender o ser angélico. Vejamos algumas passagens tanto do Antigo como do Novo Testamento.
1. Gênesis 16:1-16
Um anjo do Senhor aparece para Hagar depois dela ter sido mandada para o deserto com o pequeno Esaú por ordem de Sara. O Anjo fala para Hagar no idioma dela: "Multiplicarei sobremaneira a tua descendência, de modo que não será contada, por numerosa que será" (v.10).
2. Gênesis 22:1-19
Temos a história clássica do sacrifício de Abraão e Isaque. E o anjo do Senhor aparece para evitar e branda na língua de Abraão: "Deveras te abençoarei, e grandemente multiplicarei a tua descendência, como as estrelas do céu e como a areia que está na praia do mar; e a tua descendência possuirá a porta dos seus inimigos; e em tua descendência serão benditas todas as nações da terra; porquanto obedeceste à minha voz" (vv.17-18).
3. Êxodo 3:1-6
A conhecida história da sarça ardente, a sarça que não se consumia. Um anjo aparece do meio do arbusto e fala com Moisés na sua própria língua, a língua de Moisés.
4. Mateus 1:18-24
O anjo aparece à José e diz na língua do carpinteiro de Nazaré: "José, filho de Davi, não temas receber a Maria, tua mulher, pois o que nela se gerou é do Espírito Santo" (v.20). E José entedeu.
5. Lucas 1:5-25
Gabriel anuncia o nascimento de João Batista à Zacarias na própria língua do sacerdote ancião: "Não temais, Zacarias; porque a tua oração foi ouvida, e Isabel, tua mulher, te dará à luz um filho, e lhe porás o nome de João; e terás alegria e regozijo, e muitos se alegrarão com o seu nascimento; porque ele será grande diante do Senhor; não beberá vinho, nem bebida forte; e será cheio do Espírito Santo já desde o ventre de sua mãe; converterá muitos dos filhos de Israel ao Senhor seu Deus" (vv.13-16). E o anjo foi entendido.
6. Atos 8:26-40
Um anjo aparece ao diácono Filipe e lhe diz no próprio idioma do servo do Senhor: "Levanta-te, e vai em direção do sul pelo caminho que desce de Jerusalém a Gaza, o qual está deserto" (v.26). Filipe entedeu e a missão foi cumprida.
Nota-se que nos exemplos citados e em todas as aparições de anjos descritas na Biblia, o anjo sempre falava na língua dos homens, língua da terra; não idioma dos anjos ou dialeto do céu.
CONCLUSÃO
À vista do que foi pesquisado até aqui, temos algumas conclusões a tirar. Primeiro, não há, em toda Escritura, a Língua dos anjos. Segundo, Isaías 28:11 e 33:19 não é uma profecia vetero-testamentaria sobre as línguas estranhas. Isso já é forçar o texto. Terceiro, Marcos 16:17-18 fala-se de novas línguas, novos idiomas. Quarto, I Coríntios 13:1 Paulo está dando uma condição. E quinto, os anjos falam no nosso idioma.
Francimar Pires
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